Orlando Fedeli
Socialismo Bíblico
- Localização: Campo Grande – MS
A Paz de Cristo esteja convosco
Caríssimo profº Fedeli
Parabenizo-vos por este belo trabalho, que propaga a grande fé Católica.
Eu sou um Católico fervoroso, no entanto sou entusiasta socialista, longe de qualquer ditadura stalinista, maoísta e castrista, pois as revoluções dirigidas por esses líderes foram apenas a transferência do poder da burguesia liberal para os dirigentes do PC, que continuaram a exercer o poder, talvez de forma mais opressora que faria o próprio capitalismo, como se nota no livro “A revolução dos bichos”.
Posso parecer dúbio ao dizer “Eu sou um Católico fervoroso, no entanto sou entusiasta socialista”, mas o cristianismo desde os primórdios possuía um caráter socialista como aparece em At 2, 44-45 “todos os fieis viviam unidos e tinham tudo em comum. Vendiam as suas propriedades e os seus bens, e dividiam –nos por todos, segundo a necessidade de cada um”, ora, se as primeiras comunidades cristãs viviam em uma forma de socialismo e eram chefiadas pelos apóstolos, qual o motivo de nos não seguirmos esse caminho?
Alias o texto transcrito acima coincide com Marx ao declarar no Manifesto Comunista que “ cada um produza segunda a sua capacidade e receba segundo a sua necessidade”
O verdadeiro socialismo só pode se tornar possível com o aprimoramento do sentimento cristão de desapego as coisas materiais como Jesus sempre pregou ex. Zaqueu, entretanto de pé, diante do Senhor disse lhe :”Senhor vou dar a metade dos meus bens aos pobres e se tiver defraudado alguém o restituirei o quádruplo”. Jesus disse : “Hoje a salvação entrou nesta casa, porquanto esse também é filho de Abraão” ( Lc 19, 8-9)
Portanto eu acredito que o catolicismo e o verdadeiro socialismo presente na Bíblia devem andar de mãos juntas
Prezado professor Fedeli se eu estiver errado por favor me mostre o certo, se for possível me aponte fontes para um posterior estudo sobre o assunto.
POR FAVOR ME RESPONDA!!!
Grato!
Na Paz de Jesus Cristo
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Muito prezado,
Salve Maria!
Muito obrigado por seus parabéns ao site Montfort*.
Você principia sua carta confessando uma contradição existente em você, pois me diz:
“Eu sou um Católico fervoroso, no entanto sou entusiasta socialista”.
Meu caro, isso é como afirmar que elefante é mosquito pois que ambos são animais que tem tromba. Pio XI ensinou que é impossível ser católico e socialista ao mesmo tempo:
“Católico e socialista são termos antitéticos. (…) Socialismo religioso, socialismo cristão, são termos contraditórios. Ninguém pode ser, ao mesmo tempo, bom católico e verdadeiro socialista” (Pio XI, Quadragesimo Anno, 15 de maio de 1931. Denzinger, 2270. O itálico é do original. O negrito é meu).
Mas então, meu caro, como conseguiu você a proeza de realizar o impossível em seu espírito?
O socialismo defende a igualdade dos homens. O catolicismo defende a desigualdade como legítima e boa, e sempre condenou o igualitarismo. entre eles não há conciliação possível.
Sobre esse tema da desigualdade, peço-lhe que leia o trabalho sobre Desigualdade e Igualdade de Direitos no site Montfort*. Lá, você encontrará as provas de São Tomás sobre o bem da desigualdade entre os homens e as provas de que Jesus defendeu, particou e recomendou que se tratassem desigualmente as pessoas.
Também é falsa a sua interpretação de que a princípio o cristianismo foi de caráter socialista.
Nos Atos dos Apóstolos, se conta que os primeiros cristãos, em Jerusalém, colocavam tudo o que tinham em comum.
Nisso se baseiam, hoje, os Teólogos da Libertação, assim como outrora se fundamentaram algumas seitas protestantes, para afirmar que a Igreja, primitivamente, foi comunista. Ora isso é totalmente falso, como se pode depreender do próprio texto dos Atos dos Apóstolos.
Com efeito, nesse livro do Novo Testamento se pode ler o que aconteceu com Ananias e Safira (Atos, cap. V). Nesse capítulo V dos Atos dos Apóstolos, se conta que esse casal de judeus, tendo se convertido, resolveu dar um campo que era deles, para São Pedro, como era costume em Jerusalém.
Entretanto, Ananias e Safira não quiseram dar tudo, e guardaram uma parte do preço do campo que haviam vendido. Entregaram, então a São Pedro somente parte do preço obtido, retendo o restante para si.
São Pedro os condenou, não por terem guardado parte do preço do campo, mas por terem mentido. Por isso, se lê que São Pedro lhes disse:
“Não é verdade que, conservando-o, o campo era teu, e mesmo depois de vendido, não estava em teu poder o preço? Por que puseste em teu coração tal coisa? Não mentiste aos homens, mas a Deus” (Atos, V, 4).
Recomendo-lhe que leia todo esse capítulo V, mas já do texto que citei se compreende que ninguém era obrigado a dar tudo aos Apóstolos. Dava quem queria.
Portanto, não havia comunismo de bens em Jerusalém, na Igreja primitiva.
Esse exagero dos cristãos de Jerusalém, veio de uma compreensão errada do conselho de Cristo ao jovem rico.
A esse moço, Jesus disse:
“Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres (…) e segue-me” (Mt. XIX, 21).
Portanto, Jesus não mandou dar tudo aos pobres. Aconselhou fazer isso apenas aos que desejavam ser perfeitos. Daí, a Igreja sempre ter distinguido os religiosos, que fazem voto de pobreza, do povo comum que não é obrigado a fazer esse voto.
Da mesma forma que o voto de celibato não é para todos, porque senão acabaria a humanidade, assim também os votos de pobreza e de obediência são só para os que buscam a perfeição religiosa.
A vida religiosa perfeita (dos frades e freiras) segue os três conselhos de perfeição; que são os votos de pobreza obediência e castidade. Os fiéis comuns devem obedecer aos mandamentos apenas.
O direito de propriedade é um direito natural, como o é também o direito de casar-se. Mas, aqueles que pretendem alcançar uma perfeição mais alta, estes renunciam ao direto de propriedade e ao de casamento, para seguir a Cristo mais de perto.
Espero que tenha compreendido a explicação que lhe dei, e que atendi seu pedido de que o corrigisse caso estivesse errado. Que Deus o guarde. E escreva-me sempre.
In Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli
*O professor Orlando Fedeli foi presidente da Associação cultural Montfort de 1983 a 2010.