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331- Culto a Nossa Senhora

Orlando Fedeli

Culto a Nossa Senhora  

 

  • Localização: Brasil

 

 

Querido Professor Orlando Fedeli.

No meio evangélico, a veneração aos santos e à Maria sempre foram criticados, por não encontrar sustentação na Palavra de Deus. Tenho ouvido, como contra argumento, que esta prática vem da tradição da Igreja. Contudo, a tradição um dia começou, pois não existe registro dessas práticas no Livro de Atos dos Apóstolos, portanto, na Igreja primitiva(também, podemos citar, como exemplo, os Salmos – onde Davi sempre se dirige a Deus diretamente, sem recorrer a nenhum santo).

Eu gostaria de saber como tudo isso começou e qual foi a influência do paganismo para a prática do culto aos mortos (dia de finados), como também para as festas de santos. Por que é necessário recorrer aos santos, quando o véu do Santos dos Santos já foi rasgado, e já temos acesso ao Pai, através de Jesus Cristo?

Antecipadamente, agradeço pelo resposta. Atenciosamente.

 

 

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Muito prezado, salve Maria.

Não é verdade que na Sagrada Escritura não se fale de recorrer aos santos. Todo o Antigo Testamento demonstra o contrário.

Veja, por exemplo, que, no Livro de Jó, Deus recomenda aos amigos desse homem sofredor e imagem de Cristo, que recorram a Jó como seu intercessor, e que, se asssim o fizerem, Deus os atenderá: “Tomai, pois, sete touros e sete carneiros, ide ao meu servo Jó e oferecei um holocausto por vós; e o meu servo Jó orará por vós; admitirei propício a sua intercessão, para que não se vos impute essa estultícia, porque vós não falastes de Mim o que era reto como o meu servo Jó.” (Jó, XLII, 8).

Portanto, nesse texto da Escritura se recomenda expressamente que o pecador recorra a um intercessor santo, diante de Deus, como exatammnete faz a Igreja Católica.

Como você vê, meu prezado, os protestantes não sabem “ler”a Bíblia.

Também no Gênesis se lê que Abraão intercedeu por Sodoma (Gn XVIII, 32) e Lot intercedeu por Segor (Gn XIX, 21). O próprio Deus afirma de Abraão a Abimelec, que, “porque (Abraão) é profeta, rogará por ti (Abimelec) e tu viverás” (Gn XX, 7).

É também por causa de Abraão que Deus abençoa Isaac (Gn XXVI, 24).

Também Judá intercede por Benjamin junto ao Intendente do Egito (que ele então desconhecia que era seu próprio irmão José).

Dir-me-á você — com razão — que este fato não é com relação a Deus. Mas este fato demonstra que é natural e próprio do homem buscar intercessores junto aos poderosos. Assim, qualquer protestante, precisando obter algo de algum superior, recorre a um intercessor próximo dele que peça por ele, a fim de alcançar o que precisa. O mesmo fazemos com Deus.

Por isso, Moisés intercedia constantemente pelo povo: “Entretanto levantou-se uma murmuração do povo contra o Senhor, como de quem se queixava de fadiga.. O Senhor, tendo ouvido isso, irou-se. E o fogo do Senhor, aceso contra eles, devorou uma extremidade do acampamento. O povo tendo chamado Moisés, Moisés orou ao Senhor e o fogo extinguiu-se” (Num XI, 1-3).

Frequentemente, durante o Êxodo, quando o povo estava em algum perigo, ou sendo punido, Moisés orava a Deus, pedindo perdão dos pecados do povo, pelos méritos de Abraão, Isaac e Jacó.

Por exemplo, no episódio do bezerro de ouro, Deus queria punir o povo e abandoná-lo, e Moisés rogou, então, dizendo: “Senhor, por que se acende o teu furor contra o teu povo, que tiraste da terra do Egito com uma grande fortaleza e com uma mão poderosa? (…) Lembra-Te de Abraão, de Isaac e de Israel, teus servos, a quem por Ti mesmo juraste, dizendo: “multiplicarei a vossa descendência…” (Ex. XXXII, 11-13).

Ora, Abraão, Issac e Israel já não estavam neste mundo, e entretanto os seus méritos, invocados por Moisés, clamavam a Deus pelo povo. Porque, aquele que é santo, mesmo após a morte, continua amigo de Deus, e continua a rogar pelos pecadores que a ele recorrem como intercessor.

E, pouco depois, Moisés intercedeu de novo pelo povo, dizendo a Deus: “Se eu, pois, achei graça em tua presença, mostra-me a tua face, para eu Te conhecer e achar graça ante os teus olhos; olha para o teu povo e para esta nação” (Ex XXXIII, 13).

No Deuteronômio IX , você encontrará outro exemplo dessa intercessão de Moisés, quando Deus diz a seu grande profeta : “Deixa que Eu o destrua (ao povo) (Deut. IX, 14). E, pouco adiante, Moisés intercede por Aarão, e, por causa dessa intercessão, Aarão é poupado por Deus (Deut IX, 20).

E enquanto Moisés orava pelo povo, Deus não punia os israelitas: “E quando Moisés tinha as mãos levantadas, Israel vencia, mas, se as abaixava um pouco, Amalec levava vantagem” (Ex. XVII, 11).

Por que Deus fez contar isso, na Escritura, senão para que compreendêssemos que, por amor a um intercessor, Ele atende o pecador? E mesmo depois da morte de um homem justo, ou santo, — que é a mesma coisa que justo — Deus continua seu amigo.

Os exemplos do Antigo Testamento comprovando que Deus quer que nós, pecadores, recorramos a Ele por meio de intercessores — homens que tiveram vida santa e que, mesmo após a morte, continuam seus amigos, pois foram para o “seio de Abraão, isto é, o céu — são inúmeros.

No Novo Testamento essa doutrina não poderia ser mudada, pois que tem base na própria natureza. Assim, nas bodas de Caná, Jesus não pretendia fazer nenhum milagre pois “não era chegada a sua hora”. Mas, a pedido de Nossa Senhora, que intercedeu pelos noivos que não tinham mais vinho, Ele fez o milagre por causa da oração da Virgem Maria a seu Filho. (Jo. II).

Também Cristo não atendia aos clamores da mulher fenícia, que rogava por sua filhinha. Mas, só quando os Apóstolos intercederam por ela, Cristo respondeu a eles e atendeu depois a oração dela por sua filha (Cfr. Mt XV, 23).

E nos Atos dos Apóstolos, se conta que São Paulo teve que ser curado de sua cegueira por Ananias. Portanto, recebeu a cura milagrosa de sua cegueira, pela oração de Ananias. Isto foi para nos mostrar que, se o próprio São Paulo recebeu graça por oração e mérito de outro, também nós devemos recorrer aos santos que implorem por nós a Deus.

Em suas cartas, São Paulo se recomenda continuamente à oração dos cristãos e diz que rezará por eles.

Quanto a rezar pelos mortos, você encontrará a legitimidade deste ato — que é lógico, até o ponto de ser aprovado explicitamente pela Escritura — no texto do II livro dos Macabeus que ensina: “(Judas Macabeu) Tendo feito uma coleta, mandou duas mil dracmas de prata a Jerusalém, para se oferecer um sacrifício pelo pecado. Obra bela e santa, inspirada pela crença na ressurreição, porque se ele não esperasse que os mortos haviam de ressuscitar, seria uma coisa supérflua e vã orar pelos defuntos. Considerava que, aos que falecerem na piedade, está reservada uma grandíssima recompensa. Santo e salutar pensamento este de orar pelos defuntos” (II Mac. XII, 43-46).

Claro que os protestantes dirão que não aceitam os livros dos Macabeus como inspirados. Mas então, quem decide o que é inspirado ou não seria o homem. Se assim fosse, todos os livros da Bíblia poderiam ser rejeitados. Quem decide que livros pertencem à Sagrada Escritura é a Igreja, e não um homem particular.

Quanto à Igreja primitiva, é falso dizer que os primeiros cristãos não cultuavam os santos como intercessores. Basta ir às Catacumbas para constatar o contrário. Os primeiros cristãos recolhiam os restos dos mártires — as relíquias — e os sepultavam piedosamente nas catacumbas, deixando monumentos indicativos de que rezavam aos mártires como santos, que estavam no Paraíso com Deus, e que intercediam pelos vivos..

Como também nas catacumbas se acham, ainda hoje, pinturas representando a Cristo, a Santíssima Viegem Maria e os Apóstolos, nos altares que os primeiros cristãos lá faziam, sobre as relíquias dos mártires.

Você vê bem, por tudo isso, meu caro, como erram os protestantes ao se recusarem a rezar aos santos como seus intercessores, e como eles lêem mal a Bíblia.

Restaria dar as provas — numerosíssimas — dos milagres realizados pelos santos, após a morte, atendendo a quem a eles recorre.

Leia qualquer vida de santo, para ver que milagres eles faziam em vida, e mesmo após a morte. Por isso, a Bíblia diz do Profeta Eliseu que “em sua vida, ele fez prodígios, e na morte, ele operou maravilhas” (Eclto. XLVIII, 15), referindo-se ao fato de que os ossos de Eliseu ressuscitaram um morto (Cfr. II Reis XI, 21).

Eis aí, meu caro, o que me ocorreu dizer-lhe em resposta à sua pergunta. Creia-me sempre, seu fiel amigo,

in Corde Jesu, semper

Orlando Fedeli