Orlando Fedeli
São Francisco e as Cruzadas
- Localização: Brasil
Caro Professor Orlando,
Primeiramente meus parabéns pelo ótimo trabalho desenvolvido no site da Associação Montfort*.
Minha dúvida é a seguinte: é verdade que São Francisco pregou em favor da cruzadas? Escutei isso não me lembro de quem nem aonde.
Pergunto porque alguns frades modernistas que conheço sustentam que São Francisco era um santo adocicado, quase imberbe que odiava a guerra, que era ecumênico. Tenho dificuldades de imaginar um santo assim, ainda mais um santo da estirpe de um São Francisco, o Seráfico.
O senhor teria alguma citação, alguma referência dessa passagem que lhe disse?
Desde já, muito obrigado.
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Muito prezado,
Salve Maria!
Muito obrigado por seu elogio e parabéns ao site Montfort*. Peço-lhe suas orações por nós.
Pobre São Francisco, tão mal compreendido, hoje, e tão abandonado e até de imagem deformada.
Querem fazer dele um santo romântico e ecológico. Pior ainda um santo pacifista.
Costuma-se dizer que os santos sofrem durante a vida, e que, mesmo no céu, tem que suportar a deturpação de seus atos, nas páginas de seus biógrafos, que muito deturpam seus passos e intenções.
São Francisco jamais pregou contra as cruzadas.
Nem poderia fazê-lo, pois que senão, ele não seria santo.
Durante a Quinta Cruzada, quando os cristãos cercaram Damietta, no delta do Nilo, no Egito, São Francisco foi para lá.
O cerco durou 17 meses.
Certa vez, São Francisco teve uma visão de Deus, que lhe disse que os cristãos seriam derrotados num combate que preparavam. São Francisco os preveniu, mas não foi ouvido, e, nesse combate, os cristãos perderam 6.000 homens. Mas o cerco de Damietta prosseguiu.
São Francisco, então, resolveu ir até os maometanos, para tentar convertê-los ou morrer mártir. Foi até as tropas maometanas que aprisionaram ao santo e ao frade que o acompanhava, batendo muito nos dois frades.
Levado diante do sultão do Egito, Malek Kamel, São Francisco pregou valentemente o cristianismo, a Santíssima Trindade, e atacou Maomé de modo nada ecumênico. Queriam matá-lo por isso, mas o Sultão não deixou.
São Francisco desafiou, então, os ulemás maometanos a entrarem com ele numa grande fogueira.
Quem saísse vivo da fogueira teria provado que seu Deus era o verdadeiro.
Nenhum ulemá aceitou entrar na fogueira.
São Francisco propôs, então, a Malek Kamel, que ele entraria sozinho no fogo. Caso ele morresse, seria como punição de seus pecados. Caso ele saísse vivo, seria a prova de que o Cristianismo era a religião verdadeira. E, nesse caso, o sultão deveria se fazer batizar com todo o seu povo.
Desta vez, foi o sultão que ficou com medo…
O Sultão Malek Kamel, de medo de ser deposto pelos seus homens, não aceitou nem essa proposta.
Ofereceu então muitos presentes ao santo da pobreza, que os rejeitou todos.
A pregação de São Francisco, que foi ouvida até pelos lobos, não foi aceita pelos muçulmanos, que provaram assim serem mais duros que lobos.
Malek Kamel deixou partir São Francisco que voltou ao campo cruzado.
A guerra prosseguiu, e depois de 17 meses de cerco, Damietta foi tomada.
Hoje, se procura denegrir São Francisco, como se ele tivesse combatido a Cruzada.
Os pacifistas modernos — contrários às guerras e às polêmicas — e sempre dispostos a dialogar com os inimigos de Deus e da Santa Igreja, dizem inspirar-se no exemplo de São Francisco.
Se fossem sinceros, eles deveriam ir até os inimigos de Deus, e, como São Francisco, pregar a eles a religião verdadeira com destemor, e atacando as falsas religiões, assim como São Francisco atacou Maomé, diante dos maometanos.
Se fossem mesmo sinceros imitadores de São Francisco, esses pacifistas deveriam propor, como ele, entrarem numa fogueira junto com os hereges e ateus, para ver quem sairia vivo.
Desconfio de que ninguém, aí, sairia vivo.
Mas, assim como não ouve nenhum ulemá disposto a aceitar o desafio de São Francisco, duvido que qualquer padre pacifista e ecológico atual enfrentasse o fogo de um palito de fósforo para defender suas heresias.
O que prova esse caso da vida de São Francisco é que certos hereges e infiéis nem com o exemplo de um santo como São Francisco se convertem. Nem com a promessa de um milagre. Ora, se nem a santidade de um São Francisco conseguiu converter certos pecadores, não será o diálogo ecumênico — um bla-bla blá pseudo teológico — que vai conseguir isso.
Como disse Santa Joana d´Arc, uma santa de couraça e de espada na não, “só se conseguirá a paz na ponta da lança”
in Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli
PS. Conheço poucos livros sobre São Francisco. Um, ruim, é o de Jorgensen. Um livro sobre o franciscanismo que lhe recomendo é a tese de Nachman Falbel “A Luta dos Espirituais Franciscanos e sua Contribuição para a Reforma da Teoria Tradicional acerca do Poder Papal”,Departamento de História da USP.
*O professor Orlando Fedeli foi presidente da Associação Cultural Montfort de 1983 a 2010.