Orlando Fedeli
Imortalidade da Alma dos Índios
- Localização: Recife – PE
Prezado professor Fedeli,
Salve Maria!
Não poderia iniciar minha missiva de outra maneira que não fosse externando os meus sinceros cumprimentos pelo zeloso trabalho que o senhor e todos da Montfort* fazem em defesa da Fé. Que Maria Santíssima possa sempre abençoar abundantemente o combate de você. Que seja o estandarte da Virgem sempre ostentado diante do exército do Senhor, do qual vocês muito dignamente participam!
Venho por meio desta tirar uma dúvida, que um ateu me suscitou num debate em um desses fóruns da net. Ele disse-me que a Igreja dizia que os índios não tinham alma. Ora, eu falei que isso era absurdo, porque no Brasil os missionários morriam junto com os índios. Mas ele redargüiu que isso não era no Brasil, e sim na américa hispânica. E me citou um livro de um tal José Alves de Freitas Neto, cujo título cito abaixo:
“Bartolomé de Las Casas – A Narrativa Trágica, o Amor Cristão e a Memória Americana”
José Alves de Freitas Neto
Quando objetei se tratar de um romance, ele disse que não era, que o referido José Alves tinha sido professor de história dele e a tese de doutorado do mesmo estava expressa sobre a forma de romance nesse livro. Pelo que ele me disse, conta a história de um frei – Bartolomé de Las Casas – que disse terem os índios uma alma, ao contrário do que pregava a Igreja na época.
Pesquisei rapidamente na internet, e vi que o tal frei realmente foi uma personagem histórica.
A pergunta é: quem foi esse Frei Bartolomé de Las Casas? O que, em sua história, bate com o que foi dito no livro e citado pelo ateu no debate?
Se tiver informações sobre o José Alves de Freitas Neto, eu agradeço. Se é realmente um historiador sério, se publicou mesmo uma tese de doutorado sobre a Igreja pregar que os índios não tinham alma, e, caso positivo, em que se baseou para fazer isso.
A propósito… a Igreja tem algum documento sobre os índios, na época colonial? Sobre os negros, eu descobri que a primeira censura oficial do Vaticano foi feita por Pio II, em 1462. Já sobre os índios, eu desconheço.
Agradeço antecipadamente a atenção que me dispensa. Que Deus possa cobrir ao senhor e a toda a Montfort* das graças necessárias para que vocês continuem no combate pela Fé, é o que eu desejo.
In corde Iesu, semper,
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Muito prezado,
salve Maria!
Muito lhe agradeço suas bondosas palavras de apoio e de louvor ao Trabalho da Montfort* em defesa da Fé e da Igreja Católica Apostólica Romana, que é a única Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Peço-lhe que reze por nós, para que Deus nos dê graças e forças para prosseguirmos nesta batalha.
O atrevimento dos maus e a burrice imensa que se estendeu sobre o mundo é que permitem escrever tolices como essa de que se julgava que os índios não tinham alma.
Ora, em geral, quem diz essa calúnia contra a Igreja são historiadores marxistas, ou filo materialistas, que negam a existência da alma em qualquer homem, e não só nos índios.
Se eles negam que o homem tenha alma, por que se fingem de escandalizados dizendo que os espanhóis negavam que os índios tinham alma?
Ao mesmo tempo em que esses “historiadores” caluniadores dizem que se considerava que os índios não tinham alma, eles afirmam que os espanhóis impunham aos selvagens a religião católica à força. Ora, se os colonizadores julgassem que os índios não tinham alma, para que quereriam lhes impor a religião católica?
Como se pode ter a ousadia de escrever tais tolices, sabendo-se que os jesuítas vinham exatamente catequizar e ensinar a religião aos índios?
Se os jesuítas julgassem que os índios não tinham alma, jamais os teriam catequizado e batizado.
A Igreja sempre condenou a escravidão e sempre defendeu os índios e negros como seres humanos.
Já na carta de Pero Vaz de Caminha se diz que a maior riqueza da terra descoberta “eram as almas dos índios a converter”. E a Igreja sempre fez missões com os índios e negros, para convertê-los a fé, e batizá-los. Ora, só podia fazer isso por afirmar que eles eram seres humanos dotados de alma imortal.
O Papa Paulo III (1534-1549) na Bula Sublimis Deus, exigiu respeito aos índios e às suas propriedades.
Quanto ao Frade dominicano, depois Bispo de Chiapas, Frei Bartolomé de Las Casas, todos os inimigos da Igreja o louvam e apresentam seus escritos como prova da maldade e dos crimes da colonização, considerando-o como o grande defensor dos índios e inimigo da escravidão.
Não dizem, porém, que Las Casas tinha escravos índios e negros, e que foi ele um dos propulsores da escravidão dos negros na América.
Já Frei Motolinia, um dos grandes missionários do México após a Conquista, venerado pelos índios diz de Las Casas que ele “não aprendeu a língua indígena, nem se aplicou a ensinar aos índios” (Frei Motolinia, Carta ao Imperador Carlos V, apud Joaquin Jareño Alarcón e Miguel A. Garcia Olmo, Humanidades para un Siglo Incierto, Quaderna Editorial, Múrcia , 2.003, p.56).
Las Casas foi um homem agitado e de tal modo exagerado em suas afirmações que houve historiadores que o tiveram como louco.
Salvador de Madariaga, em sua obra Cosas Y Gentes afirma, citando Montesinos que Las Casas jamais ensinou religião aos índios, e que ele era tão só contraditório e exagerado que “Las Casas era um doente mental que lutava com a paranóia” S. Madariaga, Cosas y Gentes, Espasa Calpe, Madrid , 1960, apud Joaquin Jareño Alarcón e Miguel A. Garcia Olmo, Humanidades para un Siglo Incierto, Quaderna Editorial, Múrcia , 2.003, p.55).
Um outro historiador, escreveu:
“(Las Casas) era sumamente inquieto e tinha tendência à exasperação e a considerar-se uma espécie de enviado de Deus. Não faltaram estudiosos que puseram em dúvida seu equilíbrio mental, entre eles destaca-se Menéndez Pidal que chega a considerá-lo paranóico na sua obra El Padre Las CASAS, su doble personalidad (1963)” (Joaquin Jareño Alarcón e Miguel A. Garcia Olmo, Humanidades para un Siglo Incierto, Quaderna Editorial, Múrcia , 2.003, p.55).
Quanto à tese romance desse autor que você cita José Alves de Freitas Neto, não a li, mas deve ser divertida.
Sobre esse problema da imortalidade da alma dos índios e sobre a escravidão indígena e negra na América recomendo-lhe que leia os seguintes livros:
– TERRA, Martins J. E. S. J.(org) –- in Revista de Cultura Bíblica nº 26-27, São Paulo, Loyola, 1983.
– BENCI, J . Pe. – Economia Cristão dos Senhores no Governo dos Escravos, Lisboa, 1954.
– BETTENCOURT, Estevão – O Tráfico Negro no Brasil e a Igreja
– MALHEIRO, A. M. P.- A Escravidão no Brasil – São Paulo, Cultura, 1944.
In Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli.
*O professor Orlando Fedeli foi presidente da Associação cultural Montfort de 1983 a 2010.