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Em uma manhã azul do México

Orlando Fedeli

Em uma manhã azul do México

Salve Maria!

Há anos, publicamos um texto, na secção castelhana do site Montfort, homenageando um mártir mexicano, o Padre Francisco Vera. Ele foi fuzilado pelos comunistas mexicanos, guiados então pela maçonaria, por estar rezando Missa, durante a guerra civil entre os católicos do Movimento Cristero contra as hordas do Partido Revolucionário Institucional do México, que levou esse país católico ao comunismo.

Apresentamos, hoje, a nossos leitores, a versão em português da homenagem que fizemos ao padre Francisco Vera. Mas inicialmente citamos as palavras do Presidente da República mexicana, o maçom Emílio Portes Gil.

Extrato do “discurso pronunciado pelo presidente do México, Emilio Portes Gil, em 27 de Julho de 1929 diante dos líderes da Maçonaria após a assinatura dos Acordos que puseram fim à rebelião dos católicos cristeros”. (“Acordos” esses, feitos pelo Cardeal Gasparri, o inimigo de São Pio X… Acordos que acabaram levando à morte muitos dos chefes cristeros).

O Pres. Emílio Pontes Gil deixou claro, em seu discurso, que a perseguição ao clero e à Igreja, “que dura vinte séculos … e é eterna”, foi executada pela Maçonaria, para implantar seus princípios anticatólicos.

“Veneráveis irmãos: Enquanto o clero foi rebelde às instituições e leis do governo da República, estive no dever de combatê-lo como era necessário… Agora, queridos irmãos, o clero reconheceu plenamente o Estado e declarou sem rebuços que se submete estritamente às leis…

A luta não se inicia, a luta é eterna.

A luta se iniciou há vinte séculos. Desse modo, pois, não há que espantar-se: o que devemos fazer é permanecer em nosso novo posto, não cair no erro em que caíram os governos anteriores… que, com tolerância após tolerância, e com contemplação após contemplação, foram conduzidos à anulação absoluta de nossa legislação. O que é preciso fazer, pois, é ficar vigilantes. Os governantes e os funcionários públicos, devem permanecer zelosos em cumprir a lei e fazer com que ela se cumpra. E enquanto estiver eu no governo, ante a Maçonaria eu protesto que serei zeloso para que as leis do México, as leis constitucionais que garantem plenamente a consciência livre, porém que submetem aos ministros das religiões a um regime determinado; eu protesto, digo, ante a Maçonaria que enquanto eu estiver no governo, se cumprirá estritamente a legislação.

“No México, o Estado e a Maçonaria, nos últimos anos, foram uma mesma coisa: duas entidades que marcham juntas, porque os homens que nos últimos anos estiveram no poder souberam sempre solidarizar-se com os princípios revolucionários da Maçonaria”.

(Do discurso pronunciado pelo presidente do México, Emilio Portes Gil, em 27 de Julho de 1929 diante dos líderes da Maçonaria, após a assinatura dos Acordos que puseram fim ao levante cristero).

 

 

Em uma manhã azul do México.

Ao sol.

 

Homenagem ao Padre Francisco Vera, sacerdote e mártir

Padre, cujo nome, até hoje, nem sequer eu sabia, e que provavelmente, na terra, bem poucos conhecem, quero prestar-te, mártir de Deus, minha pobre, porém ardente homenagem.

Hoje, quase ninguém sabe de teu sacrifício ocorrido, há tantos anos, numa manhã azul do México. Nem ao menos se sabe que houve um governo maçônico e comunista, no México, no século XX, governo que perseguiu a Igreja de Deus, assassinando seus sacerdotes.

Em nossos dias, Padre Francisco Vera, quase ninguém te conhece. A História se esqueceu de ti. Depois do Concílio Vaticano II, muitos só louvam teus assassinos. Na Igreja nascida do Vaticano II, fizeram-se acordos com eles, e se os chama de “homens de boa vontade”…

Até mesmo muitos dos católicos, mesmo os fiéis, não sabem de teu martírio. E – dor suprema – a Igreja, ao menos por suas autoridades mais conhecidas, parece quererem te esquecer, e fazer esquecido teu heroísmo e tua confissão da Fé.

Tu és um padre de outros tempos.

Hoje, tudo mudou.

Hoje, não se quer que haja sacerdotes intransigentes que terminem mártires: deseja-se o “diálogo”. O diálogo ecumênico e relativista, que é capaz de fazer acordos os mais incríveis. Até com a heresia. Até com o pecado.

Querem que os sacerdotes sejam amáveis, diplomáticos e simpáticos, e não padres “teimosos” como tu, com tua face séria e imperturbável ante a morte”. [Perdoa-me, Padre Francisco, são eles, os modernos, os modernistas, os acrobatas do diálogo, que te diriam isso, não eu. Eu, nunca! Eu nunca!]

Para os modernistas atuais, teu comportamento foi por demais radical – dizem — e muito pouco aberto, e nada ecumênico.

Aos olhos dos prudentes deste mundo, tu foste “um fanático”.

Sozinho tu estavas naquela manhã azul, ao sol do México – ao sol de Deus – ao dar teu silencioso testemunho, sereno, ante as armas assassinas.

Tudo era calma e suavidade naquela cena vista por poucos na terra, porém contemplada com amor ardente pelos Anjos. Ao sol, na manhã azul do México.

Ao sol.

Inusitadamente, com os paramentos da Missa, ao sol, em teu silêncio, parecias dizer aos que iam te matar: Introibo ad altare Dei (Entrarei até o altar de Deus).

Sim! Jamais, Padre Francisco, pronunciastes essas palavras do princípio da Missa de maneira mais verdadeira do que nessa manhã, na qual entraste no céu do Altíssimo.

Verdadeiramente o perfeito Introibo ad altare Dei.

Nessa “Missa”, ao sol, na manhã azul do México, sozinho, ante os carrascos, tu mesmo eras a hóstia de teu ofertório. Não só apresentavas a oferta de ti mesmo a Deus, tu a oferecias em pagamento pelos pecados de mundo, junto com a hóstia Divina ofertada no Calvário, ao sol também, uma tarde… Há tanto tempo… Eternamente.

Daí, a suavidade e serenidade com que olhavas os soldados que miravam tua pessoa sacerdotal.

E eles, também, parece que, – eles também –, te olhavam docemente, com os rostos carinhosamente apoiados no fuzil.

E miravam com lentidão, suave e calmamente, para não perder o tiro.

Um mirava tua cabeça, para punir teu pensamento fiel a uma Igreja retrógrada, fiel a uma Igreja que não aceita o mundo moderno, nem sua “civilização” pagã. Tu, fiel à Igreja que recusa evoluir, e a aderir – cum gaudio et spes – ao mundo e a seu príncipe, tu permanecias de pé ante o mundo novo. Tu, homem do mundo antigo, filho da Igreja de sempre, filho da Roma eterna, sacerdote do Altíssimo, in aeternum secundum ordinem Melquisedec, no paredão, para morrer por Deus.

Na manhã azul, ao sol, com Gaudium et Spes, dizendo um NÃO rotundo e mudo, porém clamoroso, com teu sangue, ao mundo moderno, às suas pompas miseráveis, e às suas obras tenebrosas e ímpias.

E, em silêncio, aguardavas a ordem de fogo do oficial aos carrascos.

E, enquanto aguardavas, eles miravam docemente, apontando-te docemente seus fuzis.

Um outro soldado mirava a teu coração, para matar tua caridade, para que se vertesse dele o sangue de teu amor inextinguível. E à ordem de “Fogo”, ele desejava extinguir teu amor de fogo.

E só lograva, então, alimentar o fogo com fogo.

Eles te miravam docemente, para matar-te, enquanto tu os miravas docemente, perdoando-os, aguardando que te abrissem com os disparos, a porta do céu na manhã azul do México.

Ao sol.

Disse-te eu já que, hoje, os padres não se parecem contigo?

Olhe, tenho uma outra foto, aqui, em minhas mãos.

É a de um outro sacerdote.

É a fotografia de um sacerdote atual, um sacerdote pós-moderno. Um sacerdote como tu, porém dos novos tempos, posteriores ao Vaticano II. Um sacerdote modernista que quer voltar a ser um homem primitivo.

Não posso publicar sua foto, que está numa revista que se diz católica.

Porém tu a podes ver desde o céu.

É essa a figura de um sacerdote católico?

Sim, é a de um sacerdote católico. Um pseudomissionário.

Ele não tem paramentos. Nem ao menos usa camisa. Está seminu – “inculturado” – entre os índios aos quais ele deveria levar a religião verdadeira. Meio nu, na noite das trevas da morte

Olhe seus olhos.

São vazios.

E contemplam a noite

Parece que não têm mais alma.

Ele quer apenas fazer fluir sua vida, à maneira selvagem, olhando a noite.

Para ele, apagou-se o Sol de Justiça, e não há verdade. E não há mais sol. E não há mais manhã azul, nas quais se pode morrer pela verdade.

Ao sol.

Ele é incapaz de dizer – e menos ainda de compreender – o Introibo ad altare Dei.

E ele não tem nada a oferecer.

E que ofertório seria ele capaz de fazer?

Ele seria competente apenas para a apresentação dos dons, “frutos da terra e do trabalho do homem”.

A diferença entre ele e tu é a do natural para o sobrenatural.

E quantos não são nem capazes de ver isso! De ver o sol. Numa manhã azul.

Nas trevas, não há azul

E quantos sacerdotes conservadores protegem a impiedade e os erros dos maus para poderem imitar suas ações más com palavras e ações equívocas. A “fraternidade” – o “amor”, como dizem agora, a filantropia, e não mais a caridade.  E a “obediência” de certos padres é o escudo e a escusa para eles aprovarem muitos erros…

Que é, hoje, um sacerdote conservador?

É aquele que fará amanhã aquilo que o modernista fez anteontem.

Que é um sacerdote conservador?

É aquele que diz sempre que fará amanhã – bem escondido na obscuridade, o que o sacerdote heroico faz agora.

Ao sol.

O que tu fizeste ontem, no México, em uma manhã azul. Ao sol.

Dizem os sacerdotes “prudentes”: “Hoje, não posso, porque há dificuldades, e é preciso ser cauteloso. E é preciso obedecer”.

Prudentemente, ainda que seja contra a Fé.

“Ademais, hoje, estou muito ocupado”…

Que é um sacerdote conservador?

É um padre muito hábil em encontrar razões que lhe permitam adiar, ou dispensar-se, de cumprir o dever, agora.

Esses padres prudentes, jamais irão ao paredão.

Porém tu, Padre Francisco, em tua fidelidade, tu foste até o paredão. Até o céu. Em uma manhã azul do México.

Ao sol.

Tu, Padre, cujo nome desconhecia até esta manhã, teu nome é exaltado nos céus pelos coros dos anjos e dos santos. Porque tu fizeste a vontade de Deus na terra, como a quer Deus, no céu. Sem fugas e sem esquivas. Bravamente.

Ao sol.

Bem-aventurado és tu, Padre Francisco. Por isso te dedico uns pobres versos, que fiz, um dia, versos que desejo sejam para te homenagear.

 

En mi alma hay una llama

que la quema por entera.

El amor es que me llama

A morir por tu bandera

¡Es mi Deus El que me llama

A morir por su bandera!

 

Si la Iglesia verdadera,

la mi vida me pidiera,

yo mil vidas yo las diera

por la Iglesia y su bandera.

Diez mil vidas yo las diera,

por guardar la Fe entera.

 

Ah gran Dios, yo bien quisiera

Que mi alma antorcha fuera,

 que otras almas encendiera,

´n el amor por tu bandera.

Que en mi alma siempre ardiera

El amor por tu bandera

 

Y la gloria derradera

Por la cual yo bien muriera,

Dar mi sangre roja e fiera

Por mi Dios y su bandera.

Con mi sangre roja e fiera

Hacer roja su bandera.

 

Pudesse eu, como tu, dar também meu sangue, sem valor, e dar minha vida, com tantos pecados, por Deus, pela Igreja e por sua bandeira!

Sim.

É o que te peço, Padre Francisco, que me obtenhas de Deus – ainda que eu não o mereça de modo algum – morrer como tu, pela Igreja e sua bandeira.

Em uma manhã azul.

Ao sol.

 

Orlando Fedeli

(27 de Novembro de 2003)