Mais do que prometia a força humana

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Marcelo Andrade

MAIS DO QUE PROMETIA A FORÇA HUMANA  [1]

 

No magno poema “Os Lusíadas”, Camões põe beleza nos feitos portugueses no além-mar.

Na primeira estrofe, o sexto verso: “Mais do que prometia a força humana” é uma realidade em verso, pois muitos navegadores pareciam ter uma força além do esperado para os homens comuns.

Portugueses nesta categoria: Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Martim Afonso etc.

Neste curto texto, destacaremos três nomes menos conhecidos: Francisco D´Almeida (1450-1510), Aires de Saldanha (1542-1605), e Furtado de Mendonça (1558-1611).

O primeiro, Dom Francisco D´Almeida, lisboeta, lutou a serviço dos reis católicos na conquista de Granada, em 1492.

Foi designado como o primeiro Vice-Rei da índia, no comecinho do século XVI.

Nesta época, os “turcos” tentavam destituir Portugal dos mares e venceram uma batalha naval em Chaul, na qual morreu o filho de Francisco, Lourenço.

Uma outra batalha se anunciava, desta vez, maior ainda e decisiva pelo controle dos mares das índias orientais.

D. Francisco foi polido e avisou ao capitão de Diu, Maliqueaz, mameluco e inimigo, porém, homem honrado que ia atacar a cidade:

Eu o visorei digo a ti honrado Meliqueaz, capitão de Diu, e te faço saber que vou com meus cavaleiros a essa tua cidade, lançar a gente que se aí acolheram, depois que em Chaul pelejaram com minha gente, e mataram um homem que se chamava meu filho; e venho com esperança em Deus do Céu tomar deles vingança e de quem os ajudar; e se a eles não achar não me fugirá essa tua cidade, que me tudo pagará, e tu, pela boa ajuda que foste fazer a Chaul; o que tudo te faço saber porque estejas bem apercebido para quando eu chegar, que vou de caminho, e fico nesta ilha de Bombaim, como te dirá este que te esta carta leva.

Dom Francisco reuniu 18 embarcações formadas por naus, caravelas e galés para enfrentar a armada inimiga composta de:

 200 velas!!!

A armada inimiga era apoiada pelo sultão do Cairo, sultão otomano, samorim de calecute, pelo sultão de Guzerate e vergonhosamente apoiados também por Veneza e por Ragusa.

Como Dom Francisco esperava ganhar com tão poucos barcos?

Se Portugal tivesse feito cálculo numérico para enfrentar os mares, não teria saído nem de Lisboa.

Combinando bravura e excepcional estratégia, numa luta que “lutava-se contra as ondas e inimigos e o mar convertido em sangue e ar em fogo”, como se escreveu depois, Dom Francisco venceu, perdendo apenas 30 homens e nenhum barco! Capturou a maior parte das embarcações inimigas, impondo mais de 1.500 baixas ao inimigo.[2]

Com a vitória, Portugal pôde por muito tempo garantir a rota das especiarias e o apostolado em todo o Oriente.

Depois das índias, Dom Francisco andou pela África onde caiu em batalha, ferido de morte por uma azagaia, a beira mar, na Aguada de Saldanha – norte do Cabo da Boa Esperança-, tendo o Oceano como testemunha.

Conhecido por nunca ter faltado com a palavra e cumprido todas as promessas, além de jamais ter fugido de pelejas, teve como merecido o escrito em sua Lápide:

Aqui jaz D. Francisco D´Almeida

Primeiro Vice-Rei da índia

Que nunca mentiu nem fugiu

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O segundo barão assinalado, de Santarém, Aires de Saldanha, filho de outro herói (Antonio de Saldanha que navegou com Afonso de Albuquerque) foi governador da Índia.

Defendeu Goa;

E Cochim;

E Rachol;

E Málaca;

E Aguada;

E Bengala;

E Molucas;

Etc.

Também funcionou no Algarve de Além-Mar, como capitão de Tânger, onde pelejou contra os inimigos.

 Ele venceu mouros em terra e mar, pôs para correr outros inimigos de Portugal e espantou os holandeses.

Morreu em naufrágio ao voltar para Portugal na costa dos Açores, foi enterrado em Angra do Heroísmo – sugestivo nome.

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O terceiro, também lisboeta, Furtado de Mendonça, lançou-se no além-mar aos 18 anos, com valentia e guardando a honra e a moral, sem se deixar se seduzir pelas delícias do Oriente. E em poucos anos se tornou capitão.

Ele foi encarregado de limpar o Índico de piratas, o que fez com destacada bravura, em especial no cerco e conquista do forte pirata de Pudepatão.

Enviado a Málaca, ia enfrentar o maior desafio de sua vida em uma das mais impressionantes defesas de forte de que se tem noticia.

No curso da guerra Luso-holandesa, o flamengo Matelieff cercou a fortaleza com uma armada de 15.000 homens e os lusitanos eram 150 ! Proporção de 100 para 1.

Mendonça resistiu heroicamente durante 3 meses e meio sob incansável bombardeio e luta. O forte recebeu mais de 400 tiros de canhão.

 Os holandeses, que perderam mais de 250 homens, fugiram ao saber da aproximação de uma esquadra lusa de apoio.

Mendonça foi designado governador da Índia, mas logo depois teve de retornar a Portugal.

Ele morreu em naufrágio, após cruzar o cabo da Boa Esperança (que belo simbolismo), foi enterrado na Igreja das Graças ao lado de Afonso de Albuquerque. Foram 33 anos de serviço e embates nos mares.

O comum a estes dois últimos batalhadores do mar, Saldanha e Mendonça, foi que nunca tiveram de entregar armas aos inimigos, jamais conheceram a derrota.

E morreram no mar.

Apenas o Oceano teve a força e a grandeza suficientes para vencê-los.

Afinal, como diz Pessoa: “Ó mar salgado quanto do teu sal são lágrimas de Portugal!”

—–

Marcelo Andrade, 4 de fevereiro de 2016, no dia da festa, em Portugal, do santo lisboeta São João de Brito.

[1] Estas e outras histórias estão relatadas no livro: “Homens, Espadas e Tomates”, de Rainer Daehnhardt.

[2]  As três bandeiras do Sultão do Cairo capturadas por Portugal nesta batalha estão no convento de Cristo, em Tomar.

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