167- Igreja Santa e Pecadora

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Orlando Fedeli

Igreja Santa e Pecadora

 

  • Localização: Brasil

 

Caros amigos, estou estupefato com o site dos senhores. A princípio pensei que se tratasse de um veículo de Evangelização, mas lendo e percebendo os conteúdos de alguns ítens verifiquei que os senhores pararam no tempo e no espaço. Vivem uma fé e espiritualidade que já não existe. São contra tudo e todos: contra o Movimento Carismático, que tantos frutos positivos trouxe à nossa Igreja, como a volta de muitos jovens e afastados ao seio da Mãe Igreja; contra a Teologia da Libertação cujo teor é inteiramente evangélico, pois prega a Igualdade entre as Classes Sociais, entre as raças e buscam uma Ordem Política Renovada baseada na Justiça e na Partilha; além disso o site é altamente retrógrado, ultrapassado, chega até a incentivar a volta do uso de batina nos padres, que absurdo! É contra o Ecumenismo, movimento que é altamente apoiado pelo nosso Querido Papa, enfim, vocês vivem uma religião que não existe mais. Hoje, é impossível viver uma fé, uma espiritualidade, que aliena o indivíduo da sua condição humana, econômica, social e política. É preciso unir Fé e Vida, mas uma Fé Viva, dinâmica, construída no dia a dia das pessoas, em meio às suas lutas, aos seus problemas. Celebrar o Deus da Vida e do Amor é o papel fundamental da Liturgia. A Renovação Carismática, o Movimento Progressista e tantos outros segmentos que surgem e surgirão na Igreja são como uma refeição que contém diversos tipos de alimentos, necessários ao desenvolvimento pleno do organismo humano. Nesse sentido gostaria de enfatizar o meu pensamento, que é o pensamento atual da Igreja e que está sendo ignorado pelos senhores. Sou Católico Praticante, inserido em Pastorais diversas, sou consciente que a minha Igreja é santa e pecadora. Espero que um dia ela seja somente santa.

Os tempos mudaram irmãos, não é mais possível viver a nossa fé baseados em documentos antigos da Igreja que são, a cada dia, substituídos por novos que também no futuro serão renovados, porque essa é a Lei da Vida. Infrigi-la, é cair no mais atroz dos erros.

Graça e Paz de Nosso Senhor Jesus Cristo
Seu irmão…

 

———-

 

Prezado senhor …,
Seja louvado Nosso Senhor Jesus Cristo.

Respondemos com prazer a sua mensagem de crítica contra nós.

O senhor, em poucas linhas, nos acusa de tantas coisas que teremos que lhe dar uma longa resposta.

Antes porém de responder às críticas contra nós, começaremos por contestar uma acusação que o senhor faz à Santa Igreja.

O senhor afirma estar consciente de que “a Igreja é santa e pecadora“. Santa ela é. Pecadora, não. Protestamos contra esta acusação, que por ser feita sem distinções, é caluniosa e herética. Herética sim, porque, feita como o senhor a fez, sem nenhuma ressalva ou distinção entre o que é humano e o que é divino na Igreja, vai direta e rotundamente contra o que se afirma no Credo : “Creio na Igreja, una, Santa, Católica e apostólica” (Credo in Unam Sanctam Catholicam et Apostolicam Ecclesiam).

Prezado sr., a Igreja, enquanto tal, não é e nem pode ser pecadora. Pecadores são os homens que dela fazem parte; em primeiro lugar nós: eu e o senhor.

Hoje em dia, se faz facilmente a confusão entre Igreja e clero. O clero é parte da Igreja, e parte mais importante, porque é ao clero que cabe governar a Igreja, ensinar e administrar os Sacramentos. Mas o clero não é de per si, sozinho, a Igreja. A Igreja é uma sociedade divina e humana. Divina porque sua cabeça é Cristo. Humana, porque seu corpo é feito de homens. Mas a Igreja enquanto tal ela é sempre santa. E Cristo prometeu que as portas do inferno não prevalecerão contra ela, isto é, que ela jamais ensinará a mentira nem o pecado.

É fácil atribuir pecados à Igreja — e não venha, por favor, nos falar nem de Galileu, nem da Inquisição, espantalhos agitados pelos inimigos de Deus e que só assustam católicos tíbios e ignorantes da História (se quiser, conversaremos sobre estes pontos). Não nos venha a falar de Alexandre VI e de outros Papas criminosos do passado, porque eles, embora chefes da Igreja, não eram a Igreja. E o senhor deveria saber que a infalibilidade papal não significa impecabilidade papal.

A Igreja Católica é santa e impecável, meu caro sr. …

Agora vamos às suas acusações contra nós.

O senhor nos acusa, em primeiro lugar, de só citarmos documentos papais do passado que hoje não valeriam mais. Deveríamos, segundo o sr., citar documentos atuais. Os quais, segundo o Sr., amanhã não valerão mais.

Pois então cito-lhe um documento bem atual: a encíclica Fides et Ratio, do Papa João Paulo II. Sua encíclica mais atual: a última. Nessa encíclica, ao tratar dos erros atuais, o Papa João Paulo II condena explicitamente o historicismo com as seguintes palavras:

“O ecleticismo é um erro de método, porém poderia ocultar também as teses próprias do historicismo. Para compreender de modo correto uma doutrina do passado, é necessário considerá-la em seu contexto histórico e cultural. Em troca, a tese fundamental do historicismo consiste em estabelecer a verdade de uma filosofia sobre a base de sua adequação a um determinado período e um determinado objetivo histórico. Deste modo, ao menos implicitamente, se nega a validade perene da verdade. O que era verdade em uma época, sustenta o historicista, pode não sê-lo mais já em outra”. ( João Paulo II, Fides et Ratio, n. 87).

Então, prezado senhor …, é o Papa atual que condena sua tese de que se deve seguir apenas os documentos atuais, como se o que os Papas do passado já não valessem mais hoje, ou como se um Papa atual pudesse ensinar o contrário do que foi ensinado pela Igreja no passado.

Se assim fosse, o que João Paulo II ensinou ontem, já não valeria hoje. E o que ensinou hoje, já não teria valor amanhã.

O que o senhor defende é o relativismo, que também foi condenado por João Paulo II nessa mesma encíclica Fides et Ratio. O senhor, e não nós, é que está num dos piores erros em que se pode cair: o relativismo, para o qual nada é verdade perene. Nada vale para sempre.

E note, prezado senhor …, que Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou que :

Passarão o céu e a terra; minhas palavras, porém, não passarão” (S. Marcos, XIII, 31).

Portanto, o senhor é quem segue a Lei da Morte. Deus não muda, caro senhor, e por isso o que Ele ensinou é para sempre. Recomendo-lhe que leia ainda a encíclica de João Paulo II Veritatis Splendor, na qual o Papa atual ensina com o poder das chaves que a verdade é objetiva, una, universal e imutável.

Sua crença numa fé que varia a cada dia é contrária à Fé católica e é fruto dos erros modernistas que são tão difundidos hoje em dia em nossas paróquias.

É também João Paulo II quem afirma que o historicismo conduz ao Modernismo em Teologia, o que é o seu caso.

Veja o que diz o atual Papa:

“Na reflexão teológica, o historicismo tende a apresentar-se muitas vezes sob uma forma de “modernismo”. Com a justa preocupação de atualizar a temática teológica e torná-la acessível aos contemporâneos, recorre-se somente às afirmações e ao jargão filosófico mais recentes, descuidando das observações críticas que se deveriam fazer eventualmente à luz da tradição. Esta forma de modernismo, pelo fato de substituir a verdade pela atualidade, se mostra incapaz de satisfazer as exigências da verdade a que a Teologia deve dar resposta”. (João Paulo II, Fides et Ratio, n. 87).

E o senhor confessa que é modernista – talvez inconscientemente – ao dizer que “É preciso unir Fé e Vida, mas uma Fé Viva, dinâmica”.

Que a Fé deve ser vivida e que deve ser viva, não há dúvida nenhuma.

Mas o que se entende por uma “Fé dinâmica”? Meu caro senhor, a Fé é um conjunto de verdades que Deus nos revelou e Igreja nos ensina. Ela é estável. É um depósito confiado a Pedro e aos Apóstolos. Ela não é de modo algum dinâmica, porque dinâmico é o que tem movimento, o que muda. A Fé é imutável. Embora o senhor não aceite o que a Igreja ensinou no passado, sou obrigado, em consciência, a lembrá-lo que São Pio X condenou solenemente o evolucionismo criteriológico da heresia Modernista no decreto Lamentabili:

“A verdade não é mais imutável do que o próprio homem, pois se desenvolve com ele, nele e por ele” (São Pio X, Lamentabili, erro modernista 58)

O senhor nos acusa de “ter parado no tempo e no espaço”. De viver uma fé e uma espiritualidade que já não existe” (sic). Meu caro, se nós as vivemos, então elas existem! Não vou refutar sua acusação de que estamos parados “no espaço”: basta sair de meu escritório, ou ir dar uma conferência numa faculdade, ou ir comprar pão na padaria, para ter certeza de que o senhor escreveu, na pressa e sem se dar conta, uma tolice.

E que significa “parar no tempo”? Essa é uma acusação modernista de quem gosta de estar na moda com a penúltima novidade da TV. É um mero slogan, não é uma demonstração. Em Filosofia e em Teologia isso não significa nada, a não ser que o acusador é evolucionista, modernista, relativista e historicista. Mas não é católico.

O senhor defende ao mesmo tempo o carismatismo e a teologia da Libertação, sem sequer se aperceber de que são movimentos , em certo sentido, opostos e contraditórios.

O carismatismo é místico e anti-racionalista. A Teologia da Libertação, conforme a definiu o ex-Frei Boff, é “marxismo na Teologia”. Portanto, é racionalista.

Defina-se, meu caro. Ao menos perceba a luta que existe entre os líderes carismáticos e os da Teologia da Libertação. Pelo menos perceba que os carismáticos consideram que a Teologia da Libertação é compromissada com a revolução socialista e marxista, e que os pensadores da Teologia da Libertação julgam o movimento carismático alienante.

O senhor afirma este absurdo: “A teologia da Libertação cujo teor é inteiramente evangélico, pois prega a igualdade das classes sociais”.

Ora, o que o Evangelho de Cristo nos ensina é que a desigualdade é que é a justiça, e não a igualdade. Não, não caia de costas. Leia os evangelhos. Analise. Raciocine. Cristo nasceu no povo eleito. Se havia um povo eleito, então Ele preferia um povo a outro. Por isso Deus disse:

Bem aventurado é o meu povo do Egito, e o Assírio é obra de minhas mãos, mas Israel é minha herança“.(Is. XIX,25)

E Cristo ensinou que o reino dos céus é semelhante a um rei que deu 5 talentos a um servo, 2 para outro, e apenas 1 para um terceiro. E quando voltou cobrou deles os juros (S. Mateus , XXV 14-30). E Cristo também disse:

A quem muito foi dado, muito será pedido” (S. Lucas XII, 48).

Cristo tratou desigualmente os homens. Ensinou mais para os discípulos do que para o povo. Mais para os Apóstolos do que para os discípulos.

Tratou Ele igualmente os Apóstolos? Não! A um Ele deu as chaves (Pedro); a outro, a estima (João); a outro, a confiança, entregando-lhe a bolsa (Judas); a outro, elogiou, (Natanael); a outro quis chamar em primeiro lugar (André). Mas, o Apóstolo – com maiúscula – não é nenhum dos doze. É Paulo.

Poderia citar-lhe dezenas de provas. Para encurtar esta carta que já vai longa, peço-lhe que leia o Eclesiástico capítulos XXXIII e XXXVIII, onde Deus mostra que tudo fez com desigualdade.

Recomendo-lhe também que leia o trabalho sobre desigualdade (Desigualdade & igualdade: considerações sobre um mito) que escrevi e que está em nosso site. Lá o senhor achará os argumentos de São Tomás provando que Deus fez tudo com desigualdade, porque fez tudo com sabedoria. Lá o senhor achará também muitos textos de encíclicas de muitos Papas, condenando a igualdade.

E como o senhor diz que o evangelho afirma que se deve fazer a igualdade de classes, cito-lhe só um texto, de Pio XI:

“Não é verdade que na sociedade civil todos temos direitos iguais e não exista hierarquia legítima” (Pio XI”, Divini Redemptoris, 33).

Procure ler o que ensinou sempre a Igreja e verá que ela sempre condenou o igualitarismo (no site da Montfort*, o senhor encontrará mais documentos papais dizendo a mesma doutrina no trabalho sobre desigualdade).

E como o senhor ousa defender ainda a Teologia da Libertação, quando é público que o papa João Paulo II tomou medidas contra ela?

Quanto ao carismatismo, esse movimento se diz herdeiro dos Despertados da Baviera e do Revival protestante. Como pode a árvore má dar bom fruto?

Quanto à batina dos sacerdotes, nessa questão também o senhor é que está “ultrapassado”; o que para um historicista e relativista é uma monstruosidade. Pois o Papa atual ordenou que se volte aos antigos sinais distintivos do clero.

Mas o senhor como muitos sacerdotes modernos, deve preferir os padres de bermudas e as freiras de mini saia…

Para refutar as bermudas dos padres e as mini saias das freiras teríamos que fazer uma longa explanação sobre simbologia…

Não, por hoje chega. Mas se o senhor quiser mais, se lhe restou alguma dúvida, escreva-nos que lhe responderemos, com prazer.

Em todo caso, rogo a Deus que o esclareça e salve de tantos erros em que está.

In Corde Jesu, semper
Orlando Fedeli

 

*O professor Orlando Fedeli foi presidente da Associação Cultural Montfort de 1983 a 2010.

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