Tortura na Inquisição

Data

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no email
Compartilhar no whatsapp
Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no email
Compartilhar no whatsapp
image_pdfConverter em PDFimage_printPreparar para impressão

Data: 18-Abr-2017
De: João Paulo Camargo
Cidade: Rio de Janeiro-RJ
Assunto: Tortura na Inquisição

***

Salve Maria!

Professor, o senhor poderia me falar se na inquisição tinha torturas ou isso é invenção, e se tinha qual era os método, pq os caras pegam métodos de coisas que não tem nada haver com a Europa e falam que era da inquisição.

***

Resposta

Muito prezado João, salve Maria!

Ao estudar história deve-se olhar para todo o contexto estudado.

Um erro comum é o de se ver o passado com base nos princípios e costumes da época presente. Tal erro se agrava quando a análise é feita de forma preconceituosa e parcial, como costumeiramente ocorre ao se estudar a Igreja e a Idade Média.

A Inquisição foi instituída pelo Papa Gregório IX em 1231. Ao estudá-la, portanto, é preciso ter em mente a sociedade com sua estrutura e costumes no séc. XIII.

A Idade Média foi – ainda que longe de ser uma época perfeita –, um tempo em que, nas palavras do Papa Leão XIII, “a filosofia do Evangelho governava os Estados”[1]. Época na qual a Lei de Deus era a base das leis civis.

O Estado, que então era unido à Igreja como o corpo precisa estar unida à alma para se manter vivo, também visava a salvação das almas.

Para aquela sociedade que possuía fé, a heresia era um grave crime. Grave porque a heresia leva a alma à condenação eterna. A heresia era, portanto, um crime na sociedade civil. Assim como havia outras ações criminosas, também a heresia era um crime. Ocorre que o crime de heresia, por atentar contra a Fé, só pode ser julgado por quem tem competência para tratar de questões de Fé: a Igreja. Só ela pode dizer com segurança e imparcialidade se tal ensinamento é ou não herético.

E o que estava ocorrendo no séc. XIII era que o poder civil – o imperador Frederico II – pretendia criar um tribunal para, por interesses próprios, julgar crimes de heresia. Além disso, devido à violência dos crimes cometidos pelos hereges cátaros (por exemplo assassinatos de mulheres grávidas[2]), a própria população enfurecida passou a punir tais criminosos com a morte.

A Igreja então, para proteger o herege e dar-lhe condições de defesa, instituiu o tribunal da Inquisição.

Sendo, como vimos, a heresia um crime, ela era julgada e punida como os crimes eram julgados e punidos naquela época. A Inquisição não criou um novo método de punição mesmo porque não era a Inquisição ou a Igreja quem aplicava as penas, mas o Estado. A Igreja apenas julgava se tal pessoa havia ou não cometido o crime de heresia. Se havia, a Igreja o entregava ao Estado para que este aplicasse as leis vigentes. Como muitas vezes a lei vigente punia o crime de heresia com a morte, o Estado aplicava a lei entregando o condenado a morte[3]. Ainda assim, o número de condenados pela Inquisição foi muito baixo. O objetivo da Inquisição não era condenar o herege, mas convertê-lo. A condenação era vista como uma derrota para a Inquisição que não tinha conseguido converter tal herege.

O que a Igreja criou, isso sim, foi uma nova forma de julgamento, introduzindo por exemplo o advogado de defesa para com isso ajudar o acusado a provar sua inocência.

O objetivo da Inquisição era, portanto, a conversão do herege, não sua condenação.

E como eram esses julgamentos? Com funcionavam tais processos? Não cabe aqui descrever em seus detalhes o processo no tribunal da Inquisição, mas adianto que ele era extremamente misericordioso. Basta dizer que começava com o chamado “período da graça” durante o qual todo herege, por pior que fosse, era perdoado com o simples fato de se apresentar ao tribunal. Isso mesmo, bastava a pessoa se apresentar e dizer que estava arrependida que ficava perdoada. Qual tribunal de hoje faria isso a um réu confesso?

E quanto à tortura?

A tortura era por vezes praticada nos tribunais civis daquela época. A Idade Média era uma época na qual a vida estava bem distante da comodidade de nossa época. Viviam-se poucos e sofridos anos. Não existiam anestesia nem aquecimento central. As pessoas estavam acostumadas a dor e ao esforço. Para que algo fosse considerado um castigo precisava ser alguma coisa realmente dura. Do contrário, não passaria de mais um sacrifício somado a tantos outros que cotidianamente padeciam. Por isso as penas eram mais severas.

A inquisição, contudo, colocou regras para a tortura.

As torturas, quando implantadas nos tribunais da Inquisição por Inocêncio IV (1243–1254) através da bula Ad Extirpanda (15 de maio de 1252), eram já aplicadas nos tribunais civis e faziam parte do costume daquela época. O Papa colocou a condição de que se evitasse o perigo de morte e não se lhes cortasse nenhum membro.

A tortura nunca podia durar mais do que meia hora e devia ser acompanhada por um médico. Não podia derramar sangue. Se, após a tortura, o réu não confessasse o crime, deveria abjurar o erro e ser posto em liberdade. Caso confessasse durante a tortura, tal confissão não merecia inteira fé. Um novo interrogatório devia ser feito em outro momento, sem tortura.

Havia inquisidores que se faziam torturar junto com o réu para que pudesse assim saber o que o acusado estava sentindo.

Apesar disso, o uso da tortura na Inquisição era raro. Documentos históricos, por exemplo da Inquisição no Languedoc, onde ela foi mais ativa, não citam mais que três casos em que a tortura foi usada.

A Inquisição foi um tribunal de misericórdia, feito para converter e perdoar o herege, não para condená-lo.

Por fim, recomendo-lhe que assista a aula sobre esse tema da Profa. Dra. Laura Palma (https://youtu.be/j7f3hX7-8Vg).

Peço que reze por nosso apostolado.

In Corde Iesu.

Prof. Andre Melo

[1] Conf. Encíclica Immortale Dei, 28. Leão XIII, 1885.

[2] Os cátaros, por serem gnósticos, eram contra o casamento e a procriação.

[3] O tipo de morte variava de região para região. Na França era a fogueira, na Inglaterra a decapitação etc.

image_pdfConverter em PDFimage_printPreparar para impressão