TV: amiga ou inimiga?

Data

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no email
Compartilhar no whatsapp
Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no email
Compartilhar no whatsapp
image_pdfConverter em PDFimage_printPreparar para impressão

Ir. Anna Maria Fedeli, FSM

TV: amiga ou inimiga?

 

O naturalismo a tal ponto impregna a mentalidade moderna que, mesmo aqueles que não o professam, são muitas vezes levados a considerar, quando avaliam algo, apenas os benefícios ou prejuízos materiais, deixando de lado tudo o que envolve considerações de ordem espiritual.

Um exemplo desse enfoque naturalista ocorre quando se discute a televisão. Normalmente são invocados contra ela – e não sem razão – os danos que a permanência diante do aparelho ocasiona à saúde física (por exemplo, aos órgãos visuais ou ao desenvolvimento muscular das crianças) ou à saúde mental (como causa de irritabilidade, insônia, apatia etc.).

E, no entanto, a televisão é feita para os homens e estes – quem se lembrará dos velhos catecismos? – possuem além de corpo, alma. Alma que compreende, quer e sente; livre, mas não independente dos agentes externos. Capaz de virtudes e de vícios.

A televisão age, pois, não apenas sobre os corpos, mas também, e principalmente, sobre as almas. Sobre a inteligência, sobre a vontade e sobre a sensibilidade humanas. De que modo? Com que efeitos? Favorecendo a prática da virtude ou conduzindo ao vício?

*** ***

A televisão não respeita nem os olhos, nem os ouvidos, nem a memória, nem a inteligência, nem a vontade do telespectador; mas o telespectador respeita a televisão, consagra-lhe seu tempo e seu dinheiro, sacrifica-lhe sua saúde, seus afetos, seu lazer, suas obrigações.

 

ENTENDER, REFLETIR, LEMBRAR

Deus criou o homem inteligente para que ele conhecesse a verdade. Assim, a inteligência não se deve aplicar indiferente e desordenadamente a todos os objetos, mas de modo organizado e hierárquico àqueles capazes de conduzi-la a seu fim último, o conhecimento da Verdade Absoluta.

Por sua própria natureza, a razão humana atua através da análise, distinguindo e ordenando os objetos que lhe são apresentados, extraindo deles as ideias, abstratas em si mesmas, mas estreitamente ligadas aos sentidos, uma vez que é através das sensações que o homem percebe o mundo exterior.

Na TV, as imagens se sucedem freneticamente, sem ordem e sem objetivo. Passivamente a inteligência recebe informações que não a interessam e que, de forma geral não a conduzem a nenhum ponto. Como quem comesse, sem fome, alimentos inúteis para seu corpo.

As ideias, filhas das imagens transmitidas continuamente pela tela, não têm profundidade, uma vez que o profundo só se atinge quando há pausa num ponto determinado; as imagens da TV não param nunca; não permitem reflexão nem análise; o olho mágico da televisão não perscruta; ela passa velozmente pelas superfícies, viciando a inteligência ao dificultar a prática da reflexão.

*** ***

O “saber” supõe o uso da reflexão e do julgamento, a televisão, devido à sucessão rápida e ininterrupta de imagens luminosas não concede tempo para a reflexão nem para o julgamento; ela só pode engendrar crenças sem fundamento razoável, ou pior, julgamentos temerários para o bem ou para o mal. (Turgeon, J.P. – La télévision, p.20)

*** ***

Mas, o conhecimento não é sempre bom? Conhecer, qualquer coisa e de qualquer modo, não é sempre melhor do que ignorar?

Nem sempre. É o que ensina São Tomás (cfr. Suma Teológica 2-2 q.167 a.1). Por exemplo, quando “alguém deseja conhecer a verdade das criaturas sem ordenar esse conhecimento de Deus”, cai no vício da curiosidade.

Um segundo efeito da televisão é o vício que poderíamos chamar, em linguagem corrente, pretensão ou vaidade. Dos sentidos humanos, o mais relacionado com o conhecimento é a visão. De tal modo que, naturalmente, temos certeza da veracidade dos fatos que presenciamos. Ora, a televisão produz a ilusão da presença. O telespectador vê o fato e, por isso, tem a impressão de que possui a verdade a respeito dele, emitindo vaidosa e precipitadamente juízos a respeito de todas as coisas, crendo ingenuamente conhecer aquilo de que só lhe mostraram um aspecto, um ponto de vista.

Por fim, ainda no que tange ao conhecimento, a TV é também prejudicial à memória. Aquilo que se adquire facilmente, perde-se também facilmente. Sendo o conhecimento proporcionado pela TV inteiramente superficial, ele se esvai sem dificuldade. Um estudioso do assunto usa uma comparação interessante:

“O telespectador é semelhante a alguém que põe a mão sob um jato d’água. A água corre rapidamente entre os dedos. Se o jato d’água para só ficam na mão algumas gotas. A televisão dá a impressão de proporcionar grande conhecimento, enquanto se a está assistindo. Mas o que sobra quando termina o programa? Quase nada” (J.P. Turgeon – La télévision).

A única coisa que escapa a essa regra, pela repetição, é a propaganda. Dos anúncios, sim, o telespectador se lembra.

*** ***

Não são as ideias mostradas racionalmente que tem a força de mover uma multidão, são os impulsos. A televisão não mostra as ideias de um modo racional, pois utiliza imagens que são apenas uma parte da vida, e que são, por maior boa vontade que se tenha, escolhidas, condicionadas, recriadas… (Melon-Martinez, E. – La télévision, p. 231-232)

*** ***

 

JÁ QUE VOCÊ ESTÁ AÍ…

Quando nos sentamos diante de uma tela de TV, renunciamos, durante um tempo maior ou menor, à nossa própria vida, para entregarmo-nos à vida de outros.

O mesmo não acontece, entretanto, quando vamos, por exemplo, ao teatro, ou quando nos dedicamos à leitura de um livro? Sim e não.

O livro fala diretamente à inteligência e, desse modo, as sensações ou emoções que produz não são tão impressionantes e dominadoras.

O teatro, e mesmo o cinema, integram-se num ritual de preparação, de ida, que os isola da vida cotidiana, marcando seu aspecto ficcional.

Assim, ainda que o livro, o cinema, o teatro, nos envolvam, somos senhores deles e eles estão sob nosso domínio.

A TV, ao contrário, domina nossos sentidos, penetra nossas casas, mistura-se a nossa intimidade, habita nosso ambiente. Não podemos desviar os olhos, não podemos dar ouvidos a outra coisa, não podemos falar, e isso de modo contínuo, sem isolamento, sem excepcionalidade.

*** ***

Uma vez que a preguiça nos domina, ela se transforma numa verdadeira tirania, uma escravidão cujas correntes se fazem sentir cada vez que movemos um membro. (Pe. Faber)

*** ***

A TV torna passivos os seus adoradores. Eles não precisam da vontade. Só precisam apertar um botão, e outros estarão querendo, agindo, vivendo e morrendo por eles. Inexoravelmente a TV conduz à preguiça. Não são sintomáticos os aparelhos que permitem ao viciado trocar de canal sem ter o exaustivo trabalho de levantar-se? E quem não conhece a figura molemente sentada em sua poltrona que, “..já que você está aí…”, pede a cada um que entra na sala os objetos de que necessita, incapaz de mover-se para o que quer que seja?

Também a intemperança é excitada, e de modo violento, pela TV, através da propaganda. A temperança é a virtude cardeal que nos leva a usar dos prazeres com moderação. A propaganda, por seu lado, leva a desejar o prazer sempre e cada vez mais, eliminado toda a medida.

 

O QUE ESCO???? NÃO VÊEM…

A TV isola o homem de seu ambiente. Ela o domina, tirando-o de seu círculo. “O telespectador é semelhante a alguém que usa binóculos. Ele vê bem o que está longe, mas não vê nada do que está perto” (J.P. Turgeon – op. cit.).

A comunicação é absolutamente necessária à amizade e ao amor. Cortando a comunicação entre os membros da família, a TV destrói, ao mesmo tempo, o afeto entre eles. As pessoas sabem o que se passa do outro lado do mundo, mas ignoram o que se passa no coração dos que vivem ao seu lado.

*** ***

O homem apaixonado pela televisão recusa-se a dar seu tempo e seu coração àqueles que o cercam; durante horas, ele prefere apiedar-se ou alegrar-se com situações fictícias ou longínquas; ele priva, assim, seu próximo da compreensão e da simpatia que tem para oferecer. É aí que começa o processo da separação e da solidão… Vivendo diante de seu aparelho de televisão, o telespectador dá as costas aos outros. (Turgeon, J.P. – Le telespectateur, G-13).

*** ***

Um último aspecto que também é precioso considerar, embora não pertença à essência mesma da televisão, é o nível moral dos programas.

No Brasil, esse nível – que sempre foi criticável – tem caído ultimamente de modo assustador, transformando alguns programas em pura pornografia. Mesmo quando não se vai tão baixo, é praticamente impossível encontrar um programa que não entre em choque com a moral católica no que tange à virtude da pureza. Cada vez mais o telespectador é conduzido pela TV ao desprezo de todo o pudor e de todo o freio. As pessoas acostumam-se a considerar os homens como meros animais, inteiramente dominados pelas paixões e pelos instintos.

*** ***

O telespectador mais aceita do que escolhe. As informações, as impressões vêm a ele, não é ele que as procura. E então ele se torna vítima de uma armadilha: como as imagens o fascinam, ele imagina compreender facilmente a mensagem veiculada.

Esquecendo que as imagens possuem uma carga afetiva, que elas comunicam uma mensagem sob forma de impressão, o telespectador tende a receber as impressões como ideias claras e precisas, sem perceber que a televisão se situa num nível onde o conhecimento está sempre aliado a uma certa emoção. Interpretando as impressões como explicações substanciais, o telespectador corre o risco de se subalimentar. (Benoit, F. – O homem diante da televisão, p.27).

*** ***

 

TEMPLO DE DEUS

As considerações que alinhamos acima de modo nenhum esgotam o assunto. A TV operou, desde seu surgimento, uma verdadeira revolução na moral, nos costumes, nos hábitos familiares, nas relações de amizade. Ela contribuiu em larga escala para o afastamento de Deus, que se acentua cada vez mais em toda a sociedade.

O que quisemos foi apenas fazer refletir sobre alguns de seus efeitos nas almas dos telespectadores. Àqueles que a cada dia recebem em seus lares, alegre e despreocupadamente, as imagens da TV, gostaríamos de recordar as palavras de São Paulo: “Não sabeis que sois templos de Deus?” (1Co 3,16). É nosso dever preservar e enobrecer nossa alma, morada da Santíssima Trindade, templo do Deus altíssimo.

image_pdfConverter em PDFimage_printPreparar para impressão