Orlando Fedeli
Jean Duns Scoto (1266-1308)
Esse doutor franciscano, nasceu em Maxton, na Escócia, em 1266. Estudou em Oxford e se tornou Doutor, primeiro, em Oxford, e, depois, também em Paris, em 1305, tendo falecido em 1308. Suas distinções sibilinas contra a doutrina tomista valeram-lhe o título de Doctor Sutilis com o qual foi agraciado. Foi beatificado.
Porém, Bento XVI, em sua famosa aula de Regensburg [1] apontou Duns Scoto como tendo sido, logo após a morte de São Tomás, a fonte originária de todo o mal na Filosofia. Com efeito, Duns Scoto foi o primeiro a, contrariando São Tomás, negar a analogia do ser, a conceber como possível a separação entre fé e razão, a colocar a vontade acima do intelecto, tanto em Deus como nos homens, e, finalmente, por admitir que Deus age arbitrariamente, e não sapiencialmente.
Disse o Papa Bento XVI na aula citada:
“Por honestidade, temos de referir aqui que, na teologia da baixa Idade Média, se desenvolveram tendências que rompem esta síntese entre o espírito grego e o espírito cristão. Em contraste com o chamado intelectualismo agostiniano e tomista, Duns Escoto deu início a uma orientação voluntarista que, no termo de sucessivos desenvolvimentos, havia de levar à afirmação segundo a qual, de Deus, só conheceremos a voluntas ordinata. Para além desta, existiria a liberdade de Deus, em virtude da qual Ele teria podido criar e fazer inclusive o contrário de tudo o que efetivamente realizou. Vemos esboçarem-se aqui posições próximas, sem dúvida, das de Ibn Hazm e que poderiam levar à imagem dum Deus-Arbítrio, que não está dependente sequer da verdade e do bem. A transcendência e a diversidade de Deus aparecem tão exageradamente acentuadas, que inclusíve a nossa razão e o nosso sentido da verdade e do bem deixam de ser um verdadeiro espelho de Deus, cujas possibilidades abismais permaneceriam, para nós, eternamente inatingíveis e ocultas por detrás das suas decisões efetivas. Em contraste com isto, a fé da Igreja sempre se ateve à convicção de que entre Deus e nós, entre o seu eterno Espírito criador e a nossa razão criada, existe uma verdadeira analogia, na qual por certo – como afirma, em 1215, o IV Concílio de Latrão – as diferenças são infinitamente maiores que as semelhanças, mas não até o ponto de abolir a analogia e a sua linguagem”. (Bento XVI, Aula Magna na Universidade de Regensburg, 12 de Setembro de 2006).
Foram esses posicionamentos de Duns Scoto que vão causar os erros de Guilherme de Ockham e de Mestre Echkart, assim como os erros do escolasticismo decadente do século XV (Jean de Méricourt e Nicolau d’Autrecourt) fontes da dúvida metódica do Cartesianismo e de toda a dúvida moderna.
O pecado contra a Verdade de toda a Filosofia da Modernidade nasceu dos erros de Duns Scoto.
Essa mesma posição de Bento XVI face a Duns Soto é defendida por um fenomenologista atual, André de Muralt:
“A história da filosofia coloca o começo da filosofia moderna em Descartes. Essa definição, bastante superficial, negligencia o trabalho considerável dos séculos anteriores, no curso dos quais foram elaborados os princípios que se desenvolverão sistematicamente de Descartes até Kant. Na realidade, e na medida em que é permitido arriscar um corte na história das idéias, cumpre fazer remontar a filosofia moderna ao fim do século XIII, ao momento em que, sob o impulso de três mestres, a grande síntese escolástica aristotélica e tomista começa a encontrar seus primeiros críticos. Pois está claro que as principais teses da filosofia moderna e contemporânea já estão contidas nas filosofias de Duns Scoto, Guilherme de Ockham e Mestre Eckhart” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, p. 146. A primeira edição francesa é da Editora Vrin, em 1985).
Já a conceituação de Metafísica segundo Duns Scoto coloca alguns problemas. Partindo da distinção entre Teologia, que tem Deus por objeto, e de Filosofia que estuda o ser à luz da razão, Duns Scoto chega à conclusão que a razão e a Metafísica não podem ter conhecimento de Deus, negando assim que, pela razão, se possa conhecer algo de Deus, como, por exemplo, sua existência e algumas de suas qualidades. Para Duns Scoto, quando se tenta provar a existência de Deus por meios racionais, através do exame das criaturas, no máximo se chega a provar que existe um Deus imanente ao mundo físico.
Para Duns Scoto, “Nenhuma demonstração do efeito à causa merece, de modo absoluto, o nome de demonstração: ‘nulla demonstratio, quae est ab effecto ad cusam est demonstratio simpliciter‘. Resulta disso imediatamente que todas as provas da existência de Deus são relativas, porque nós jamais atingiríamos a Deus a partir de seus efeitos” (Etienne Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, p. 602).
Essa posição vai ser ainda mais radicalizada por Ockham, que negará explicitamente que se possa provar que Deus exista, examinando as qualidades do mundo, o que vai contra o ensinamento patente de São Paulo, na epístola aos Romanos (1, 20).
Duns Scoto vai dizer que a razão humana nada pode saber dos seres puramente espirituais (Deus e os anjos).
“O intelecto humano só pode conhecer verdadeiramente o que ele pode abstrair pelos dados dos sentidos. Não temos nenhum conceito direto do que podem ser as substâncias puramente imateriais e inteligíveis, os anjos e Deus, por exemplo” (Cfr. Etienne Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, pp. 592-593).
Segundo Scoto, a Metafísica deve ter por objeto o ser em sua noção mais abstrata, aquele em que a noção de ser se aplica num só e num único sentido a tudo o que é, desde a pedra até Deus. Seria isso o que exprime Scoto ao dizer que, para o metafísico, o ser é “unívoco”. (Cfr. E.Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, p. 593).
“O ser do qual a Metafísica visa estudar não é pois uma realidade física particular, nem um universal tomado em sua generalidade lógica; é a essa realidade inteligível que é a própria natureza do ser enquanto ser” (E.Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, p. 594).
Ora, essa consideração do ser como unívoco arruína a doutrina da analogia do ser, base de toda a escolástica. Dessa noção unívoca do ser iriam nascer logo a substituição da noção da analogia tomista pela dialética gnóstica do ser do dominicano Mestre Eckhart, ou a substituição da analogia pelo univocismo panteísta racionalista do franciscano Frei Guilherme de Ockham. Desses erros advirão todas as tragédias doutrinárias, religiosas e políticas do século XIV, The Awful Century, no Distant Mirror, de Barbara Tuchman.
Duns Scoto admite que existam modos de ser, derivados das suas determinações intrínsecas possíveis. Desse princípio, Scoto retira a prova de que Deus existe necessariamente como primeiro ser.
Para Duns Scoto a criação de seres contingentes provém da pura vontade absolutamente livre de Deus, que quiz criar, porque quiz criar. Deus escolheu criar, porque essa foi a sua vontade absolutamente livre. Deus não criou nada, submetido a qualquer regra. Regra é a vontade arbitrária de Deus. Compreende-se como esse posicionamento é contrário à tese católica que faz tudo partir de um princípio: “no princípio era o Verbo” (Jo 1,1). E não do arbítrio. Não do capricho, e sim da Sabedoria divina.
Para Duns Scoto, “a vontade de Deus é, pois, senhora absoluta da escolha e da combinação das essências; ela não está submetida à regra do bem, mas, ao contrário, a regra do bem é que lhe está submetida. Se Deus quer uma coisa, essa coisa será boa; e se Ele tivesse querido outras leis morais do que aquelas que Ele estabeleceu, essas outras leis seriam justas, porque a retidão é interior à sua própria vontade, e que nenhuma lei é reta senão enquanto ela é aceita pela vontade de Deus. Não se poderia ir mais longe sem desembocar no cartesianismo; mas antes de desembocar nele, era preciso apagar antes toda distinção entre o entendimento de Deus e sua vontade” (E.Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, p. 599).
Daí virá o voluntarismo de Duns Scoto: não é a inteligência que move a vontade. Esta é absolutamente livre.
Aí está a raiz do relativismo moderno.
Essa afirmação do primado da vontade sobre a inteligência pressagia o triunfo do voluntarismo sobre o intelecto, da ação sobre a compreensão.
Duns Scoto ainda admite que se queremos um objeto é porque antes o conhecemos, e nós o queremos porque nele percebemos um bem. Porém, diz Scoto, que se conhecemos um objeto e não outro é porque nós o queremos. “Nossas ideias nos determinam, mas nós determinamos antes a escolha de nossas ideias” (E.Gilson, La Philosophie au Moyen Âge, Payot, Paris, Vol.II, p. 599).
Seria a nossa vontade que determinaria livremente nosso conhecimento.
O Doutor subtil admite que podemos ter dois tipos de conhecimento: um conhecimento intuitivo, e um conhecimento abstrativo.
A distinção entre um conhecimento abstrativo e outro intuitivo era uma novidade trazida por Duns Scoto. Aristóteles não fala de conhecimento intuitivo, e “para a filosofia medieval, a questão estava resolvida. Seus intérpretes mais importantes rejeitam, em sua maioria, uma intuição intelectual absoluta e imediata” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, p. 65. A primeira edição francesa é da Editora Vrin, em 1985).
Para Scoto, porém, o conhecimento intuitivo seria humanamente possível e ele não utilizaria nenhum conceito. Esse conhecimento gozaria ainda de uma intencionalidade semelhante àquela que São Tomás atribui à vontade: assim como a vontade tem intenção de possuir um objeto pelo bem que há nele, assim também a inteligência teria uma intenção afetiva para com o que quer conhecer. No próprio ato de conhecer entraria a vontade, colocando uma intencionalidade no ato de conhecer.
E isso aproxima Duns Scoto da filosofia moderna, especialmente da Fenomenologia.
Evidentemente, esse conhecimento intuitivo seria um conhecimento direto, posto pelo próprio Deus no intelecto humano. Dar-se-ia na intuição humana algo parecido com o que ocorre no conhecimento angélico: ao criar os anjos, Deus já lhes teria infundido o conhecimento de suas ideias eternas.
Matéria sem forma é impossível de existir, porque uma pura matéria sem forma teria pelo menos o ato de seu ser, que faria dela matéria. Mas como o que faz ser uma coisa qualquer é a sua forma, matéria sem forma é impossível de existir. Logo, toda matéria só pode existir tendo forma de matéria.
Se não é possível existir matéria sem forma, o contrário é possível: existir uma forma sem matéria. É o que são os seres angélicos, pura forma sem matéria.
Uma pura forma, mesmo antes de ser realizada numa matéria, não é uma indeterminação total como seria a matéria sem forma. A forma já é concebida no Verbo de Deus, em seu entendimento divino, como uma natureza ou essência definida. Mas a ela falta ainda o ato de ser, isto é, a existência enquanto ser real. Às puras formas inteligíveis deu dá existência ao criá-las como anjos.
“As formas ou razões que preexistem desde toda eternidade no Verbo divino decorreram dEle de duas vias: uma foi no intelecto angélico, por outra afim de subsistir em suas naturezas próprias. Elas procederam do Intelecto divino no intelecto angélico pelo fato de que Deus imprimiu no espírito dos anjos as semelhanças das coisas que Ele produziu existirem na natureza” (São Tomás de Aquino, Suma Teológica, I Q.56, a.2. Apud Joseph Moreau, De la Connaîssance Selon S. Thomas D’Aquin, Beauchesne, Paris, 1976, p. 35).
Enquanto as coisas existem em sua natureza, e esse é seu esse naturale.
Enquanto essas razões se refletem no intelecto as coisas têm um esse intellectuale. Ao ser criado, o anjo recebe de Deus, impressas em seu intelecto, todas as formas ou razões das demais naturezas, tanto corporais quanto espirituais, conforme o seu esse intellectuale. E é por meio dessas impressões de espécies que o anjo conhece todas as criaturas materiais e espirituais de modo intuitivo.
É vidente pois que esse tipo de conhecimento próprio dos anjos não pode existir na natureza humana que só conhece por abstração, retirando dos seres materiais sua forma substancial, por abstração intelectual.
Como Duns Scoto admitia que houvesse na homem intuição sem conceito, isto é um conhecimento humano intelectual direto, sem abstração?
A respeito disso, deve-se lembrar ainda que Duns Scoto admitia a possibilidade de haver matéria sem forma determinante. E essa ideia terá consequências graves na teoria do conhecimento. Porque, se é possível haver matéria sem forma, como a causa formal do conhecimento está na forma do objeto conhecido, causadora da matéria do conhecimento no intelecto humano, então seria também possível haver o conhecimento de algo que não existisse. O homem poderia conhecer xoró no avesso, sendo xoró, – ainda mais no avesso -, algo absolutamente inexistente. O conhecimento intuitivo seria assim um conhecimento sem objeto real. Um conhecimento posto na mente humana diretamente por Deus, arbitrariamente, e não causado por um objeto realmente existente.
Podendo existir matéria sem forma, também poderia existir conhecimento sem objeto conhecido, sujeito conhecedor sem objeto conhecido.
“Rompendo a unidade da matéria e da forma, Duns Scoto permitiria a dissociação entre o conhecimento e a coisa, entre o sujeito e o objeto. Sujeito e objeto estão, com efeito, para o aristotelismo, numa relação análoga à existente entre a matéria e a forma, o objeto determinando formalmente o sujeito no ato de conhecimento que este produz eficazmente” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, p.146).
Também essa doutrina vai ser levada a suas consequências últimas por Ockham, que vai admitir a intuição gratuita de um objeto sem existência como possível, para a mente humana.
“Guilherme de Ockham vai elaborar, portanto, uma doutrina extremamente audaciosa e plena de consequências: não é contraditório para ele que o ato de conhecimento, mesmo intuitivo, seja definido independentemente de seu objeto, pois Deus, causa primeira, pode muito bem, com sua onipotência, de potentia absoluta, substituir-se ao exercício dessa causa segunda que o objeto é, e causar imediatamente um conhecimento que apresente todas as características da autenticidade: verdade, objetividade, evidência, certeza, independentemente da existência de seu próprio objeto. Assim como, para Duns Scoto, a matéria pode ser de potenctia absoluta Dei sem a forma, para Guilherme de Ockham e os occamianos (Robert Holkot, Wlter Chatton, Nicolau D’Autrecourt, João de Mirecourt) a notitia intuitiva pode ser verdadeira e manifestar a existência da coisa conhecida sive res sit, sive non sit. (…) doravante se admite a possibilidade de um conhecimento verdadeiro e certo sem objeto correspondente imediato. Possibilidade de potentia absoluta Dei, é verdade, não realidade atestada, isso não impede que uma suspeita geral seja lançada sobre o valor do conhecimento humano” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, pp.146-147).
Desse modo o mundo começou a viver da dúvida, indo depois até o ceticismo, e, deste, até o nihilismo.
Desse intuicionismo sem objeto, Ockham passou para a admissão da possibilidade de haver ato justo sem bem objetivo real, isto é “um ato moral bom no qual a vontade não queira, não ame, nem realize o bem que corresponde às exigências maturais de sua potência.(…) Assim é que o Venerável Inceptor [Ockham] depois o terrível Roberto Holkot e o ambíguo João de Mirecourt podem afirmar que a vontade divina, da qual todo efeito é necessariamente bom na medida mesma em que foi desejado por ela, pode prescrever à alma que odeie Deus e fazê-la merecer assim a salvação eterna” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, p.147).
Desse modo o occamismo fez a dúvida afetar todo o conhecimento, e a indiferentismo manchar toda atividade moral. Disso vai nascer o luteranismo e o cartesianismo.
André de Muaralt considera que dessa crise da metafisica do final da Idade Média e a partir de Duns Scoto, nasceram duas correntes:
“Eis porque se desenvolvem desde o século XIV duas correntes de sucesso desigual: ambas desenvolvendo a hipótese occamiana e erigem-na em princípio de natura rerum, a primeira no sentido de uma metafísica racionalista da onipotência divina, da qual a filosofia clássica representa o ponto culminante, a segunda no sentido de uma crítica cujo termo é marcado pela empresa kantiana” (André de Muralt, A Metafísica do Fenômeno – As origens medievais do Pensamento Fenomenológico, Editora 34, São Paulo, 1998, p.152).
Discordamos dessa qualificação das duas correntes. De fato, da filosofia Scotista nasceram duas correntes: uma panteísta e racionalista, a do nominalismo de Ockham; outra gnóstica antirracional e dialética, a filosofia mística de Mestre Eckhart.
Se a negação da analogia e a consideração do ser como unívoco por Duns Scoto fez Ockham conduzir o pensamento humano ao nominalismo negador de todo universal, erro que levou ao materialismo, ao racionalismo e ao panteísmo, Mestre Eckhart, seguiu via oposta.
Eckhart substituiu a analogia do ser por uma dialética gnóstica. Para Eckhart, se Deus é ser, o mundo é nada, é não ser. Se o mundo é ser, então Deus é que é não-ser, o nada absoluto. E a Gnose de Eckhart tem muita afinidade com a Cabala, embora o Zohar tivesse sido escrito naquele tempo e fosse praticamente desconhecido por pensadores cristãos. Não é preciso, entretanto, excogitar contatos de Eckhart com rabinos: a colocação de princípios metafísicos errados ‘só pode levar ou ao Panteísmo (como se deu com Ockkham), ou à Gnose (como aconteceu com Eckhart).
De Duns Scoto, de Ockham, e de Eckhart nasceu o nihilismo dos séculos XX e XXI. Nasceu a Modernidade em suas duas formas: a racionalista nominalista, a forma panteísta da Modernidade; e a forma dualista dialética, de caráter antirracional: a Gnose de Mestre Eckhart.
Do racionalismo panteísta de Ockham virão a Reforma em sua forma luterana final, o cientificismo renascentista, o racionalismo cartesiano, o empirismo inglês, o barroco, o iluminismo ateu e laico de Voltaire, Diderot e dos enciclopedistas, o comunismo dos enragés da Revolução Francesa, assim como o naturalismo e o realismo do Romantismo, e, enfim, o materialismo de Darwin, e o de Marx e de seus corifeus expressos quer na filosofia, quer na arte moderna materialista, terminando na Teologia da Libertação marxista, nascida do Vaticano II.
Da Gnose anti racional de Mestre Eckhart advirão o humanismo mágico de Marsilio Ficino e do Renascimento de Leonardo e Michelangelo, a irracionalidade do subjetivismo cartesiano divinizador do Ego, e negador do conhecimento objetivo, as seitas irracionais do misticismo protestante, o maneirismo, o pietismo e o quietismo, o Idealismo de Kant e seus sucessores, a filosofia e arte do Romantismo, o Simbolismo, a filosofia gnóstica de Bergson, do Modernismo de Blondel, a Fenomenologia de Husserl e seus derivados, culminado no Vaticano II e em sal teologia negadora de todo conhecimento objetivo.
Na realidade, essas duas correntes são como dois fios que se enroscam um no outro formando um só barbante, de duas cores: uma vermelha, a do panteísmo racionalista; outra branca, simbolizando a Gnose. Ambas são as duas vertentes de uma religião oculta na história: o Antropoteísmo, divinizador do homem.
Não sem razão a serpente disse a Adão e Eva: “Sereis como deuses” (Gen 3).
Não sem razão Deus fez a serpente ter uma língua bífida.
São Paulo, 26 de novembro de 2008
Orlando Fedeli